Chef Graça
Como o tempero de Moçambique poder ser receita para o Mundo
Carlos Graça ou simplesmente Chef Graça é um ícone de referência quando se fala de gastronomia moçambicana, tendo representado a culinária Moçambicana em quase todos os continentes e trazendo para o País algumas medalhas ganhas em concursos internacionais.
Nascido na Zambézia, no centro de Moçambique, região conhecida como “a terra do côco”, teve contacto com a culinária desde cedo. Filho de mãe cozinheira profissional, a quem ele atribui a “culpa” por tudo o sucesso que hoje tem, dela herdou o gosto pela cozinha e a inspiração para as receitas que lhe deram o sabor de uma vida que ainda hoje abraça, diariamente.
“É graças a ela que sou o que sou hoje. A minha mãe deu-me diretrizes sobre comida tradicional moçambicana, aquando da minha participação no meu primeiro concurso de gastronomia em Macau (China). Lembro-me que me ligou a dar dicas e orientações, coisas como ‘não tapes a panela quando cozinhares o teu caranguejo com côco para que o caril não fique coalhado e com mau aspecto’”, recorda. “Devo tudo isso a ela”, conta, com um brilhozinho nos olhos.
Da Zambézia e da inspiração temperada dos pratos da sua mãe, Chef Graça partiu para o mundo, tornando-se, porventudraporventura, se não no melhor, no mais renomado e respeitado chefe de cozinha em Moçambique. A receita? Amor. “Sim, amor pela gastronomia moçambicana.”
E não só cozinha como também, através da sua arte (porque a culinária é, essencialmente, uma expressão artística que, se exponenciada, proporciona o prazer de quem a consome, como quase todas as artes), afinal ajuda a divulgar a cultura e a gastronomia tradicionais moçambicanas pelo mundo fora.
Chef Graça não esconde o orgulho da receptividade que as comidas moçambicanas recebem a nível internacional e reconhece o seu grande potencial, embora reconheça ainda algumas fragilidades no que é, actualmente, o panorama da gastronomia moçambicana, quando comparada com algumas das principais cozinhas do mundo, como a grega ou a italiana. “Os nossos pratos não têm muita cor, se reparar, e isso e algo que é bastante diferenciador na área gastronómica. Não é apenas o paladar que importa e nisso os nossos pratos tradicionais estão muito bem, contam também a apresentação e as cores dos pratos”, diz. “É preciso mais criatividade da parte de todos os cozinheiros nacionais, precisamos de pensar em como adicionar cor aos nossos pratos, já servi, por exemplo, numa exposição gastronómica, matapa dentro de um pimento vermelho, ficou muito bonito, com muita cor e sem alterar o sabor”.
Chef Graça é, por si só, uma marca moçambicana já bastante internacionalizada e no seu trajecto profissional já serviu a figuras proeminentes, como Nelson Mandela e grandes astros da música brasileira como Roberto Carlos e o famoso Jackie Chan das artes marciais. “São só alguns, mas tenho de dizer que, para mim, qualquer pessoa que se sente na mesa para comer algo que eu fiz, é igualmente importante, e digo-o do coração”.
Transparece verdade em tudo o que o Chef diz, o que acontece também se provarmos as suas criações. No entanto, o estado da arte preocupa-o. “Moçambique tem um grande potencial na sua rica gastronomia que é bastante aceite além-fronteiras, mas, e até por Moçambique se querer posicionar como um destino turístico de eleição, ainda há alguma fragilidade da formação nesta área que deve ser resolvida. Não existe nenhuma escola especializada e, para que haja uma nova geração a surgir que leve o que a minha fez para outro patamar, seria preciso uma aposta séria no ensino de conceitos e práticas básicas da culinária internacional. A cozinha tem uma linguagem global mas em Moçambique ainda se conhece muito pouco dessa linguagem”, deixa a nota.
É por isso que, na receita do seu sonho futuro, o Chef Graça deseja abrir um centro de formação profissional em culinária no País que possa formar profissionais altamente qualificados para reduzir o défice existente e promover mais a culinária tradicional moçambicana. “Vamos a Itália e queremos comer as famosas pizzas italianas, na China, as massas. Não seria bom ter os pratos de referência lá fora, e que alguém venha a Moçambique e queira provar o frango à zambeziana ou a mboa? Eu fiz formação em gastronomia internacional e andei por todo o mundo, mas a gastronomia tradicional moçambicana é que fez de mim o que sou hoje. E estou-lhe grato por isso”.